Estudo indica que proposta promove reestruturação profunda do serviço público, com cortes de garantias e adoção de meritocracia radical
A LBS Advogadas e Advogados publicou análise preliminar sobre a proposta de Reforma Administrativa apresentada pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ). O estudo aponta que o texto não prioriza eficiência, mas sim a redução de direitos e a reconfiguração do modelo de gestão pública com base em metas, resultados e restrições fiscais. A iniciativa reúne uma PEC, um projeto de lei complementar e um projeto de lei ordinária, ainda sem tramitação formal por depender de 171 assinaturas para ser protocolada. Por alterar a Constituição, a proposta não estaria sujeita a veto presidencial caso aprovada.
A LBS destaca quatro eixos centrais de impacto para o funcionalismo: remuneração e meritocracia radical; estabilidade e concursos; retirada de direitos e fim de privilégios; e regulamentação do teletrabalho.
No primeiro eixo, Remuneração e Meritocracia Radical, o parecer observa que a criação da Tabela Remuneratória Única pode resultar em rebaixamento salarial por desconsiderar o grau de complexidade das atribuições e gerar risco de redução de salários em início e final de carreira, o que pode desincentivar novos ingressos no serviço público. A LBS aponta que a proposta elimina progressões por tempo e institui um modelo competitivo em que “a promoção se baseia em competição entre os servidores por vagas limitadas, em uma corrida de pontos”. O bônus por desempenho — de até dois salários para servidores e até quatro para ocupantes de funções estratégicas — é visto como potencializador de desigualdades, ao exigir presença contínua ao longo do ano e excluir aposentados, além de acirrar a competitividade interna e pressionar pelo cumprimento de metas.
No eixo Estabilidade e Concursos, o documento afirma que a reforma tende a transformar concursos públicos em exceção. De acordo com a LBS, “a força de trabalho dos servidores efetivos será cada vez mais substituída por trabalhadores terceirizados”, com contratações temporárias que podem ser estendidas por até cinco anos. A análise também registra que os entes federativos perderiam autonomia para definir perfis de cargos, e que a autorização de ingresso em níveis mais elevados pode gerar subjetividade e favorecer indicações. A não-restituição da obrigatoriedade do regime jurídico único é apontada como elemento que fragiliza a estabilidade no serviço público e altera o modelo constitucional de ingresso.
No eixo Retirada de Direitos e Fim de Privilégios, a LBS sustenta que a proposta extingue direitos históricos e restringe benefícios. Estão previstos o fim de triênios, anuênios e licenças-prêmio em estados e municípios, a vedação da conversão de férias e folgas em pecúnia e a limitação de adicionais, com exigência de comprovação pericial individual para insalubridade e periculosidade. A reforma também impõe restrições rígidas ao pagamento de verbas retroativas, que só ocorrerão mediante decisão judicial baseada em precedente qualificado, o que, segundo o parecer, cria “obstáculos quase instransponíveis” para reconhecimento administrativo de direitos. A LBS classifica o eixo como parte de um ajuste fiscal que reduzirá remuneração e precarizará carreiras ao longo do tempo.
Em relação ao eixo Regulamentação do Teletrabalho, o estudo afirma que a proposta estabelece o teletrabalho como exceção, limitado a um dia por semana e a até 20% da equipe. O texto determina que servidores permaneçam disponíveis durante todo o expediente e arcando com os custos da atividade remota, além de vedar residência fora do município de lotação. Cargos estratégicos ficam excluídos da modalidade. A LBS cita pesquisa da FGV que identifica ganhos significativos de produtividade, qualidade de vida e redução de estresse no regime remoto e aponta que a restrição pode reverter avanços organizacionais e pessoais conquistados nos últimos anos, além de violar o direito à desconexão.
A LBS conclui que a proposta aproxima o serviço público da lógica empresarial, constitucionaliza mecanismos de avaliação permanente e metas, e amplia instrumentos de responsabilização individual. O escritório enfatiza que os efeitos da reforma serão de difícil reversão por estarem inseridos na Constituição e alerta que a iniciativa representa uma mudança estrutural no modelo de Estado e na carreira pública, com foco predominante no corte de direitos e na flexibilização de vínculos.
Com a possibilidade de início de tramitação a qualquer momento, o tema deve entrar no centro do debate público. A LBS reforça que o acompanhamento contínuo da proposta por servidoras, servidores e entidades representativas será determinante para a defesa das carreiras públicas e da estrutura administrativa do Estado brasileiro.









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