Cruesp usa LC 173 para justificar arrocho, mas avança com formação de GT para definir plano de recuperação de perdas e valorização nos níveis iniciais


Nova negociação acontece em 15/7. Fórum das Seis prepara indicativos de mobilização

A primeira negociação entre Fórum das Seis e Cruesp na data-base 2021, ocorrida na manhã de 10/6/2021, por plataforma virtual, teve dois pontos relevantes: 1) o uso de extensa e questionável argumentação legal e jurídica, por parte das reitorias, para justificar a manutenção do arrocho salarial, 2) a constituição de um grupo de trabalho para elaborar um plano de recuperação de perdas e valorização dos níveis iniciais da carreira. Para entender melhor cada um deles, confira o relato da reunião a seguir.

Números que falam por si
Ao falar na abertura da negociação, o coordenador do Fórum das Seis, Paulo César Centoducatte, criticou a demora no agendamento da primeira reunião, 40 dias após a data-base (1º de maio) e quase dois meses após o protocolo da Pauta Unificada (6/4). Ele lembrou que a pauta tem como focos centrais o combate ao arrocho, a valorização dos níveis iniciais das carreiras e a construção de um Plano Sanitário e Educacional em cada universidade, com a participação da comunidade universitária.

Leia o boletim do Fórum das Seis em PDF aqui

Em relação à forte corrosão do poder aquisitivo dos servidores docentes e técnico-administrativos nos últimos anos, frisou a contradição existente entre os bons resultados na arrecadação do ICMS (o acumulado jan/jun de 2021 é 24,88% superior a igual período do ano passado, e 7,43% superior à arrecadação prevista, mês a mês, pela Secretaria da Fazenda para 2021), o que tem garantido às universidades situação financeira confortável e bons níveis de reserva, e a crescente queda no comprometimento com folha de pagamento, que já se aproxima dos 70% na média das três universidades, menor nível da década. Ele lembrou que, em 2020, diante das incertezas que cercavam a economia nos primeiros meses da pandemia, o Fórum das Seis havia suspendido a data-base. “Neste ano, é evidente que as reivindicações que demandam recursos financeiros são possíveis de serem efetivadas.”

Ao final de sua fala, o coordenador do Fórum solicitou ao reitor da USP e atual presidente do Cruesp, Vahan Agopyan, que se manifestasse sobre as reivindicações.

Leis e argumentações extensas
A pedido do presidente do Cruesp e falando em nome das procuradorias jurídicas das três universidades, o professor e procurador Ignácio Maria Poveda Velasco (USP) expôs interpretação de que a LC 173/2020 – lei proposta pelo governo federal, que exigiu sua aprovação pelo Congresso Nacional como condição para regulamentar a ajuda ao distrito federal, estados e municípios, por conta da pandemia, e que trouxe restrições à concessão de reajustes e benefícios até dezembro de 2021 – impediria qualquer concessão neste momento. Ele citou o julgamento do STF, que decidiu pela constitucionalidade das regras previstas na LC 173, e também um posicionamento do Tribunal de Contas (TC-SP) frente ao questionamento apresentado por vários municípios em novembro de 2020, quando foi reafirmada a impossibilidade de concessão de reajustes até dezembro de 2021. Por fim, falou da existência de uma ação no TJ-SP, movido pelo Ministério Público (MP-SP) contra as universidades, questionando a autonomia destas instituições para conceder o reajuste salarial de maio/2019, pois esta seria uma atribuição da Assembleia Legislativa de São Paulo.

Após a fala do procurador, os três reitores disseram que, embora reconheçam a existência das perdas salariais apontadas pelo Fórum das Seis, bem como os demais prejuízos decorrentes da aplicação da LC 173, como é o caso da ausência de contratações, congelamento das carreiras e outros, viam-se tolhidos pelo temor de problemas futuros com a legalidade. Mas procuraram destacar que “isso não impede de abrir espaço para a recomposição destas perdas nos horizontes dos nossos mandatos”, como pontuou o recém-empossado reitor da Unicamp, Antonio José de Almeida Meirelles (Tom Zé). “Reafirmo minha preocupação com a valorização salarial e com as carreiras, mas não assumo compromissos com coisas que coloquem em risco a estabilidade financeira e jurídica das universidades”, completou o reitor da Unesp, Pasqual Barretti, no cargo desde o início deste ano.

Leis, interpretações e decisões políticas
Os representantes de todas as entidades do Fórum das Seis falaram na sequência do representante jurídico da USP e dos reitores. Enfatizaram que há muitos pareceres distintos e até decisões judiciais na contramão do que havia sido dito por eles. Citaram alguns exemplos, como um parecer do próprio Ministério da Economia, que deixa claro que concessões asseveradas por legislações anteriores à publicação da LC 173 não poderiam ser prejudicadas, assim como as promoções e as progressões nas carreiras. Neste último caso, o próprio parecer citado por Poveda, relativo à consulta feita pelos municípios, ao mesmo tempo em que restringe reajustes salariais, diz que nada impede as promoções e progressões, mas este ponto não foi abordado pelos representantes jurídicos das universidades. Frisaram, ainda, sentenças do próprio TJ-SP após ação movida pela Adusp, que afirmam que os ditames da LC 173 não se aplicam às universidades estaduais paulistas, pelo fato de que elas não são “entes federados” (distrito federal, estados e municípios) e sim autarquias de regime especial e com autonomia. Neste sentido, o Fórum das Seis também lembrou às reitorias que a LC 173 trata de alterações à Lei de Responsabilidade Fiscal, que é aplicada a entes federados e não a autarquias (caso das universidades estaduais paulistas).

Frente à afirmação do reitor da Unesp, de que prevê pagar em 2022 os 3% de reajuste não honrados na data-base de 2016 – “mas sem compromisso com os atrasados” –, os membros do Fórum ressaltaram que não há nada na LC 173 que impeça a sua imediata aplicação, uma vez que é evidente tratar-se de concessão muito anterior à lei federal citada. Em relação à ação movida pelo MP-SP contra a autonomia das universidades em conceder reajustes salariais, a representação do Fórum questionou: “Se a ação levar anos para ser julgada, vamos ficar com os salários congelados?”

Em todas as falas dos representantes das entidades, foram lembrados os nefastos efeitos do arrocho salarial, agravado pelo aumento da contribuição decorrente da reforma previdenciária; a situação de dificuldade por que passam muitos servidores das universidades, especialmente os aposentados; professores arcando com recursos próprios os custos das atividades remotas emergenciais e de suas pesquisas; o crescente número de pedidos de demissão de docentes e servidores técnico-administrativos, entre outros. Eles realçaram o fato de que as entidades não estão reivindicando reajuste ou aumento real, mas unicamente a recomposição do poder de compra, como garantido pela própria Constituição Federal. Pediram, por fim, que as reitorias adotem ações políticas efetivas em defesa da autonomia e da garantia dos direitos de seus servidores, e que as procuradorias das universidades atuem no sentido de sustentar essa postura e não ao contrário.

A preocupante evasão de estudantes, notadamente entre as parcelas mais vulneráveis socioeconomicamente, também foi enfatizada pelos representantes do Fórum, que conclamaram as reitorias a atentarem mais para a situação deste segmento: “Temos muitos estudantes em situação de insegurança alimentar, casos de suicídio de alunos em vulnerabilidade. Isso é urgente. É preciso acolher e dar apoio a estes estudantes, em sua maioria negros e pobres”, disseram.
Lembrando que a expectativa das entidades é que o espaço de discussões entre Fórum das Seis e Cruesp possa ser mais democrático e comprometido com as reivindicações do que vem ocorrendo nos últimos anos, os representantes do Fórum reforçaram a compreensão de que a discussão é política: trata-se de estancar a rápida deterioração a que está submetido o ensino superior público paulista há muito tempo, o que exige decisões políticas.

Os encaminhamentos da primeira negociação
Frente à cobrança da necessidade de transformar em ações concretas o reconhecimento do arrocho e da “justeza” das reivindicações apresentadas, os reitores comprometeram-se a:

  • Promover uma reunião entre os representantes das Procuradorias da USP, da Unesp e da Unicamp com os jurídicos dos sindicatos, para esclarecimentos técnicos das interpretações da LC 173/2020.
  • Criar um grupo de trabalho entre as partes para, imediatamente, estudar e propor um plano de recuperação das perdas salariais e de valorização dos níveis iniciais das carreiras. O grupo deverá apresentar suas sugestões até a próxima reunião do Cruesp com o Fórum das Seis.
  • Realizar nova negociação no dia 15 de julho, para avaliar as propostas do grupo de trabalho e demais itens da Pauta Unificada 2021, inclusive os relativos à construção de um Plano Sanitário e Educacional no âmbito das universidades.
  • Transmitir ao vivo as próximas negociações entre as partes, conforme solicitado pelo Fórum das Seis.

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